imagem retirada da net
Era Outono. Era Outono porque as árvores estavam a despir-se das suas folhas coloridas, deixando-as cair docemente ao sabor da brisa de fim de tarde. E as folhas amarelas, castanhas, vermelhas, alaranjadas, matizadas de várias cores que caíam das copas altas das árvores da rua, atapetavam as ruas, os passeios e os jardins das casas que ladeavam a alameda onde eu morava.
Era Outono e eu gostava daquele tempo. Era um tempo em que o sol se levantava tarde e se deitava cedo. Gostava do cheiro das castanhas assadas que ficava no ar sempre que passava o velho, já muito meu conhecido, vendedor de castanhas. Gostava de ter que vestir um casaco mais grosso, pôr um cachecol e um gorro de lã quando saia a meio da tarde para passear no pequeno parque no fim da rua. Gostava do cheiro da terra húmida, da relva fresca que crescia no parque. Gostava do cheiro da lã dos cachecóis e dos gorros e de me sentir quente dentro deles.
Era Outono e as crianças passavam de manhã ainda cedo para a escola. Vestiam as suas batas coloridas e usavam as pequenas mochilas nas costas e havia risos cristalinos no ar enquanto levavam as lancheiras penduradas numa das mãos e a outra ia bem agarradinha às mãos dos avós que as levavam
à escola. E eu ia atrás delas, a sorrir como só os jovens que ainda não conheceram a dor podem sorrir. Levava os livros encostados ao peito e dentro do peito uma esperança enorme no futuro. Queria ser médica. Tinha o sonho de ajudar os outros e de salvar o mundo!
Era Outono e as manhãs eram frescas mesmo que o sol brilhasse alto no céu. Depois as tardes eram curtas e os passeios eram curtos. Mas o tempo que duravam, eram horas mágicas e coloridas. Passeava feliz no parque cheio de cores e bancos de madeira, que eu adorava. Passeava feliz nas ruas ladeadas de árvores de copa larga, plátanos e aceres. Era Outono e eu caminhava feliz nas ruas estreitas e antigas da pequena cidade onde morava vendo as montras onde estavam expostos livros, brinquedos antigos, artesanato. Pequenos tesouros por descobrir.
Era Outono e eu faria anos dali a uns escassos dias. Tinha quinze anos.
Era Outono. Eu era muito jovem. Eu era feliz.
Era Outono quando aconteceu tudo o que eu queria que nunca tivesse acontecido.
Estava sentada num dos muitos bancos do parque. Na verdade não era num qualquer, era no meu preferido. Ficava por baixo da árvore mais frondosa do parque. Era um plátano que no Verão estendia os seus ramos cheios de folhas e dava sombra fresca a quem se sentasse naquele banco, No Outono as folhas começavam a cair por cima do banco, na relva, nas pequenas ruas, atapetando tudo de um colorido maravilhoso. Eu sentava-me sempre aí nesse banco de madeira velha. O livro que levava na mão é que variava de semana para semana. Depois eu passava horas a ler e de vez em quando levantava os olhos para ver as crianças que brincavam na relva mais à frente, soltando gargalhadas estridentes e felizes ou porque um grasnar mais alto de um pato me desviava a atenção.
(...)
Texto de ficção escrito por Cláudia Moreira
Outras IDEIAS minhas
Ideias de outros que eu gosto de ler
- As conversas são como as cerejas
- As palavras que nunca te direi