Era dia da ceia de Natal e a chegada dos irmãos estava prevista para aquele dia. O P. e o D., os dois irmãos deficientes do L. Um mais profundo que outro, mas ambos incapazes de se tratarem sozinhos. Incapazes de comerem sozinhos, de se lavarem sozinhos, de se vestirem sozinhos. Quando chegassem, seria esse o seu primeiro serviço, tratar deles. Tirar-lhes-ia a roupa e na banheira faria os possiveis por que ficassem lavados.
Deppois disso a ceia. O bacalhau, uma oferta, já estava a demolhar e era preciso ainda descascar as batatas. Havia também um bolo-rei que adornaria a mesa. Oferta. Depois de tudo cozido ele mesmo iria servir os irmãos e a mãe.
A mãe estava na cama. A idade avançada e o muito peso deixavam-na prostrada. A doença também. Doença essa que, sem grandes margens para dúvidas, não era apenas doença própria da muita idade e do muito peso, mas sim indisposições que se compram em garrafas de vidro em qualquer tasca de aldeia.
Não haveria nenhum presente para abrir. Nenhum chocolate para comer. Nem haveriam conversas longas à mesa, entre risos e frutos secos. Não haveria mais do que o prato das batatas com o bacalhau e uma fatia do bolo-rei da caridade. E o frio. Depois seria hora de colocar o pijama aos irmãos e deitá-los na cama. Depois seria hora de dormir como todos os dias.
No dia seguinte, manhã ainda e enquanto ainda não houvessem tentações, a mãe iria ajudá-lo com o farrapo velho. Depois viriam os outros irmãos, uns mais velhos e outros mais novos. A familia, grande, espalhada pela terra, desunidos pela pobreza, unidos pelo sangue. No resto do tempo, a solidão amarga. Depois iriam todos embora e ele teria novamente que tratar dos irmãos, da mãe e da casa.
A pobreza. A pobreza extrema. A falta de dinheiro. A falta de carinho. A falta de atenção. A falta de ajuda. A falta de tudo. Pobreza de espirito também.
L. tem um peso enorme nas costas mas nasceu com um coração muito grande, capaz de ultrapassar a grave deficiência intelectual com que nasceu. L. é uma pessoa marcada pela vida mas traz quase sempre estampado no rosto um sorriso aberto e sincero.
Quando estou de mal com a vida penso nele. É uma lição de vida.
* História real que me foi contada na primeira pessoa.
De averse a 30 de Dezembro de 2010 às 11:05
Houve alguém que disse, (e não perguntes quem, porque não me lembro) que a felicidade não tem tanto a ver com o que se conquista mas sim com o que se valoriza.
De
magnolia a 30 de Dezembro de 2010 às 11:27
Não pergunto quem....mas esse quem tinha muita razão...
De averse a 30 de Dezembro de 2010 às 11:51
aqui à dias li qq coisa do genero, que o valor da felicidade se altera conforme a situação, e pode se alterar drasticamente, o que hoje consideramos padrões minimos para a nossa felicidade, amanha perante factos não ponderados podem se tornar quase expoentes maximos de uma felicidade plena... fiquei a pensar nisso ...
De
magnolia a 30 de Dezembro de 2010 às 11:57
Se aplicarmos isso à nossa própria história de vida vemos que é verdade...
De averse a 30 de Dezembro de 2010 às 11:59
vemos?
acho que é mesmo aí que reside a questão, nessa capacidade de ver
De
magnolia a 30 de Dezembro de 2010 às 12:16
Se não vemos, deviamos ver. Deviamos parar para pensar, reflectir. Se eu pensar nisso com consciência vejo exemplos desses na minha vida...
De averse a 30 de Dezembro de 2010 às 12:27
olhar um passado...
e num presente, a capacidade é a mesma? descobrir, sentir e valorizar o que nos parece insuficiente hoje e que poderá ser a nossa felicidade amanha quando pensarmos nisso?
De
magnolia a 30 de Dezembro de 2010 às 12:47
Na minha opinião pessoal acho que é dificil mas não devemos deixar de pensar nisso. Devemos estar atentos para não cairmos no negativismo e na insatisfação. Eu confesso que muitas vezes desanimo, sofro, esperneio, sofro....mas OBRIGO-me a pensar que já estive pior, e a olhar em volta e ver a miséria e a desgraça para me sentir agradecida por tudo o que tenho conseguido. Por tirar felicidade de coisas pequenas como ver o mar, respirar ar puro. Como tirar felicidade do sorriso dos meus filhos...
Ena! Este comentário já é quase um post:)
E tu que pensas disto??
De averse a 30 de Dezembro de 2010 às 15:34
Eu?... para mim é uma encruzilhada!!
Falar na 1ª pessoa não é nada fácil...
mas bem....
eu acho que sou uma pessoa normalmente de bem com a vida, claro que o normalmente não é sempre, logo e se for sincero não sei se dou o devido valor, nuns momentos julgo ter a certeza que não dou noutros a certeza que dou. Reconheço, isso sim, que seria muito importante estar mais atento, e saber simplificar algumas situações poderia ajudar imenso...
e... :D:D ainda divagava aqui um pouco, isto dá um nó no cerebro, pelo menos no meu, depende sempre de factores de mais
De
magnolia a 30 de Dezembro de 2010 às 17:37
é daquele assuntos circulares. eu sei:)
De averse a 30 de Dezembro de 2010 às 18:10
não deixando de ser um bom assunto para debater ou aprofundar e ... se possivel interiorizar :D:D
Caso depois não haja oportunidade, desejo-te um bom final de ano
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